Securitização da dívida ativa: entre o velho e o novo

A venda de créditos vencidos e líquidos, de propriedade da Administração Pública, denominados em seu conjunto como dívida ativa, já foi tida como solução para as supostas ineficiências da execução fiscal. Sobretudo em estados e municípios, administrar e cobrar dívida ativa podem ser extremamente caros. Hoje a mesma solução vem sendo apontada, inclusive em âmbito federal, como estratégia de receita em tempos de retração econômica. Entre a velha e a nova demanda perduram entretanto incontáveis dificuldades, mas que já podem, em virtude de avanços regulatórios no âmbito tanto das finanças públicas quanto do mercado de capitais, serem em boa parte superadas.

A venda da dívida ativa mais conhecida se dá por meio da securitização. Securitizar dívida ativa é nada mais do que ceder, onerosamente e mediante veículos específicos de colocação de valores mobiliários, créditos a favor da Fazenda Pública, cuja certeza e liquidez foram devidamente apuradas.

Em que pesem discussões sobre possíveis violações à LRF e ao art. 167, IV, da CF, a securitização da dívida ativa encontra respaldo na regra da cedibilidade geral dos créditos nos termos do Código Civil, no entendimento de que a regra constitucional não abrange créditos resultantes de novação dos débitos tributários por programas de parcelamento e, ainda, em provimentos do Senado Federal. O mais recente de todos, a Res. 17/2015, que alterou a Res. 43/2001, esclareceu ser vedado aos entes federativos tão somente a cessão “pro solvendo”, isto é, a transferência do fluxo de recebimentos relativos aos direitos creditórios da dívida ativa de forma não definitiva, com cláusula revogatória, com a assunção pelo ente público da responsabilidade pelo efetivo pagamento a cargo do contribuinte ou com qualquer outra espécie de compromisso financeiro caracterizado como operação de crédito.

Resta claro, por isso, que outros tipos de cessão estão autorizados, bastando que o cedente não se responsabilize pela solvência da dívida. Assim, o risco do crédito é transferido aos investidores cessionários, cuja remuneração depende do grau de sucesso na recuperação dos créditos envolvidos na operação. Dessa forma, a dívida ativa cedida representará a transferência integral para o cessionário do risco de crédito, configurando-se uma mera alienação de ativos.

Nesse contexto, as melhores práticas sugerem a utilização de empresas estatais (tais como a CPSec, na sua 3ª emissão, ou a CADIP/RS, na sua 8ª emissão) ou de FIDCs, que são os veículos da securitização. Comumente são previamente instituídos fundos especiais para o recebimento dos créditos em cobrança administrativa. Em um segundo momento, os direitos creditórios alocados ao fundo são adquiridos pelas empresas estatais ou pelos FIDCs, quem paga por tais direitos com recursos decorrentes da emissão de valores mobiliários (debêntures ou quotas). Os debenturistas ou quotistas são, então, indiretamente pagos pelos devedores cedidos.

A operação pressupõe, contudo, leis específicas, cuja aprovação requer algum amadurecimento e, portanto, tempo. Essa a razão de a União encontrar-se um passo atrás de alguns estados e municípios, já que aguarda pela tramitação do PLC 181/2015, que modifica o CTN, e do PLO 3337/2015, ambos dispondo sobre a cessão de créditos da dívida ativa. Tais projetos de lei são atualmente apreciados pela Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados.

O interesse do mercado por tais valores mobiliários concilia-se perfeitamente com as velhas necessidades de modernização da recuperação de créditos públicos e também com as novas demandas de geração de receitas públicas. Em meio à crise fiscal que acomete os entes públicos, e graças ao progresso de acertados e estáveis marcos regulatórios, está aí uma grande oportunidade para a economia nacional.

Fonte: JOTA