Empresas ampliam opções em cartões de benefícios para trabalhadores

Cartão com antecipação de salário formaliza o ‘vale’ com desconto em folha; funcionário precisa ter cautela

De olho em companhias que precisam de mais fluxo de caixa e em trabalhadores que penam para que o salário dure até o fim do mês, empresas de benefícios têm ampliado a gama de recursos oferecidos em cartões pré-pagos de antecipação salarial. Com eles, funcionários podem fazer compras em estabelecimentos ou redes parceiras – e o montante gasto é descontado em folha no mês seguinte. Especialistas afirmam que o cartão pode ser um aliado, mas deve ser usado com moderação, para que não se crie uma relação de dependência que comprometa a renda e leve a novas dívidas.

A Sodexo, que atua no setor de vales alimentação e refeição, lançou no mês passado um novo produto em parceria com a Wex, empresa global em soluções de pagamentos corporativos. Trata-se de um cartão de adiantamento de até 30% do salário que permite ao trabalhador fazer compras, saques em caixas eletrônicos, pagamento de contas, transferências bancárias e recargas de celular. Iniciativas como essa formalizam o popular “vale”: quando o patrão adiantava o salário do empregado e descontava o valor no mês seguinte.

O produto da Sodexo funciona da seguinte maneira: o trabalhador usa o cartão e depois tem os valores descontados na próxima folha de pagamento. Segundo o vice-presidente de produtos, serviços e tecnologia da Sodexo Benefícios e Incentivos, Stener Navarro, o funcionário não tem nenhum custo para ter o cartão ou para fazer compras. Mas, se optar por saques em caixas eletrônicos ou transferências, há uma taxa de R$ 8. Se o trabalhador quiser parcelar o pagamento da transação, a taxa de juros será de 8,9% ao mês.

Desde o lançamento, cerca de cem empresas já demonstraram interesse pelo produto. “Esse cartão ajuda no fluxo de caixa das companhias, que têm tido problemas de capital de giro desde a crise econômica, além de dar suporte ao trabalhador na organização financeira, podendo contribuir para reduzir a inadimplência no País”, diz Navarro. Quem tem o cartão também tem acesso a um serviço gratuito de orientação financeira por telefone, aconselhamento jurídico e suporte social.

Já a Ticket resolveu apostar no setor de saúde. O cartão de adiantamento salarial, o Ticket Plus, já tem 18 anos, mas foi no início deste ano que a empresa passou a oferecer descontos de até 60% em mais de 40 mil farmácias e em serviços médicos de uma clínica parceira. “Com o cartão, ela pode definir a porcentagem que o funcionário pode gastar – e ele, dependendo do dia da compra, tem até 40 dias para pagar”, diz Adriana Serra, diretora de produtos da Ticket. Ela afirma que o cartão já tem mais de 1 milhão de usuários, concentrados em São Paulo, Rio Grande do Sul, Paraná e Rio de Janeiro.

 A rede Alelo lançou seu cartão de antecipação no início de 2017 depois de uma pesquisa mostrar que o vale alimentação acabava no quarto dia útil após o recebimento e o de refeição, no 21.º dia. “Os funcionários ficavam quase metade do mês descobertos”, afirma o diretor de marketing e produtos da Alelo, André Turquetto.

O produto, no entanto, apenas pode ser usado na rede Alelo, que inclui mais de 500 mil estabelecimentos de alimentação, combustíveis, farmácia e entretenimento, entre outros. Com a nova lei trabalhista, muitas empresas tem usado o cartão para dar alguns benefícios, a título de auxílio, aos funcionários, sem a incidência de impostos. Por exemplo: num dissídio, a empresa pode dar um aumento menor e complementar com um benefício no cartão. Nesse caso, a empresa define um valor e onde o funcionário pode gastar, como farmácia, por exemplo.

Em um ano, a Alelo já emitiu 300 mil cartões, com gasto médio de R$ 350 cada. “O objetivo é triplicar esse número até o fim de 2019”, diz Turquetto. Nesse caso, o ganho da Alelo vem dos estabelecimentos comerciais em que os trabalhadores fazem suas transações. Na Sodexo, a remuneração é feita pela parceira Wex, que paga um porcentual sobre todas as compras e transações financeiras feitas pelos trabalhadores.

Perfil

Segundo levantamento da Multibenefícios, unidade de negócios do GPA que também oferece um cartão de adiantamento, 80% dos funcionários que utilizam esse crédito antecipado compram alimentos. Além disso, 71% são os responsáveis pela manutenção da casa e ganham de um a cinco salários mínimos. 

“Fazem uso desse benefício principalmente chefes de família, pois embora o benefício esteja estendido a toda a rede, física e online, percebe-se um consumo de itens básicos”, aponta Sheila Moura, gerente geral de Multibenefícios. “Notamos, porém, que em épocas específicas, como a Black Friday, se destaca um perfil mais jovem, que aproveita adiantamento para usufruir de grandes promoções, como de eletrônicos.” 

Paula Sauer, planejadora financeira certificada pela Planejar, observa que essa modalidade de antecipação pode ser vantajosa sobretudo se a rede conveniada oferecer descontos, mas pode virar uma armadilha para quem não se organiza. “O trabalhador não pode esquecer que, no mês seguinte, terá um salário ainda menor”, diz. Ela ressalta que, em geral, o trabalhador não faz contas com o salário líquido, mas sim com o bruto – o que já leva a uma distorção. “O perigo é não ter disciplina e cair no piloto automático. Pois aí, se o dinheiro no mês seguinte não for suficiente, o trabalhador pode se endividar.”

Fonte: Estadão